As experiências exploradas ao longo do curso se deram com base no Trabalho de Conclusão de Curso que desenvolvi ao longo desse primeiro semestre de 2019, junto a um casal de moradores da Vila Acaba Mundo, com a qual venho tendo um contato muito próximo desde o primeiro semestre de 2018. Localizada na região centro-sul de Belo Horizonte, a Vila é cercada por alguns dos bairros mais nobres da cidade, numa região bastante central, além de fazer fronteira com uma área explorada pela atividade minerária. Tais fatores mantêm os moradores em uma situação de grande vulnerabilidade social e insegurança.

Esse contato com a Vila se iniciou pelo Programa Polos de Cidadania, grupo de extensão, ensino, e pesquisa da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, do qual participo. O Programa visa a efetivação dos Direitos Humanos e a construção de conhecimento a partir do diálogo entre diferentes saberes, fortalecendo a autonomia dos indivíduos. Dentre os vários núcleos que o compõem, está o Polos Acaba Mundo, em que realizamos junto aos moradores da vila ações como mediação de conflitos, cursos, seminários, capacitações, encaminhamento de casos a assessorias jurídicas e psicossociais, fortalecimento e criação de redes de proteção e de promoção dos direitos humanos, dentre outros, além de uma ação de usucapião coletiva que está em andamento.

A demanda do casal surgiu devido aos alagamentos em sua casa nos períodos de chuva. Márcia e Carlos moram numa casa construída por eles próprios, à margem de um dos córregos que atravessam a vila, com materiais como tapumes e pedaços de madeira. Devido à proximidade com o córrego, houve, ao longo do tempo, diversos problemas com relação à estrutura da casa, que vem se degradando.

Ambos têm uma relação de forte afetividade com o ambiente em que vivem, sendo a proximidade ao rio e à flora local um fator extremamente importante. Já tiveram uma oportunidade de morar em outra localização na vila, mas não se adaptaram ao local e acabaram voltando ao seu lar. Ao longo do semestre, conversamos bastante e pensamos sobre as possibilidades de que permaneçam ali de modo seguro. Nossos encontros foram sempre muito positivos e frutíferos. Houve sempre a preocupação de não impor conceitos e técnicas acadêmicas, mas sim estabelecer diálogos abertos, valorizando o processo e a troca de experiências, usando ferramentas com as quais os moradores se sentem confortáveis e familiarizados.

Apesar de ter evitado as linguagens acadêmicas e tecnicistas, foi muito interessante observar como elas foram muitas vezes utilizadas pelos próprios moradores. Enquanto conversávamos, por exemplo, Carlos começou a desenhar plantas baixas dos espaços que pensávamos. Deixei, posteriormente, o caderno em branco com eles, e pedi que ele e Márcia desenhassem mais, o máximo que pudessem e quisessem. Foi uma feliz surpresa quando no encontro seguinte o caderno estava cheio de desenhos, de ambos, com diversas possibilidades. Além disso, tiveram a ideia de fazer uma maquete de papelão, a qual nos ajudou muito a pensar os espaços e a relação entre eles. É extremamente importante que no processo o técnico se desvencilhe de seus pressupostos e pré-conceitos, e acolha cada problema com a atenção necessária a ele.

O processo é tão extenso quanto denso, e a cada encontro surgem novas surpresas e experiências. Entendo a assessoria técnica como um vasto campo que deve ainda ser muito explorado, exercitando sempre mais a capacidade de prestar atenção nas reais demandas existentes, em vez de arrastar consigo soluções prontas e engessadas prontas para serem impostas. A assessoria é mais uma atividade de escutar e entusiasmar os moradores a participarem do processo tanto quanto o técnico, e é importante que todos os envolvidos percebam a importância dessa relação.

​